segunda-feira, fevereiro 28, 2005

Frei Bartolomeu dos Mártires

AS RUÍNAS DERROTADAS

Deve aqui notar-se como de passagem, que as casas, ou edifícios grandes, que se arruinam jamais tornam a levantar-se, e já não são poucos os que se acham por terra, e outros, que nunca se acabaram de edificar pela morte de quem os principiou.


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sexta-feira, fevereiro 25, 2005

Alberto de Lacerda

JÓIAS

Jóias que imensa madrugada
De estrelas na ilha alegre
Do riquechó contemplo as conchas
Celestes a cintilar.

São conchas algas são prodígios
Do mar que os deuses cravejaram
Assimetricamente musicalmente no firmamento.


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terça-feira, fevereiro 22, 2005

Jall Sinth Hussein

BASMA (72)

Ilha de Muipíti
olho de terra no mar
alheio ao seu corpo


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sábado, fevereiro 19, 2005

Glória de Santana

BAIRRO NEGRO

As pequenas casas maticadas
erguem-se de longe (de séculos, de antigas datas)
contra o mar e as ondas e as algas.

Como remotas conchas embaciadas
caídas de uma súbita maré alta (lúcida e predestinada)
entre o areal e as ondulantes palmas.

As pequenas casas cúbicas e caladas
onde os problemas são primários e as janelas fechadas
e os tectos de macúti...

(Quem sofre dentro das rústicas portas não aplainadas?
Ou se encosta chorando às trémulas arestas
projectadas entre ângulos de acaso?

Que mar indeterminado e abstracto
se reflecte num olhar ou num gesto marcado
por um ignoto hábito?)


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quarta-feira, fevereiro 16, 2005

Luís Carlos Patraquim

EIS AS CASAS

Eis as casas. Grutas de sal a céu onde me descubro. E sou nome ou reboco do dia que se extenua ou sonha, vento marítimo que me leva às praias fulgurantes que faltam nos livros. Aqui me deito, peixe, memória, homem, contigo e a chuva e o iodo e o som das casuarinas circulares, teu verde escuro açoitado de desejo. O bosque.
Aqui me ergo, pendurado em panos às janelas, imagens de despudor sem mim. Porque aqui me esqueço do que me querem. Da história que me fizeram e fui. Olhem estas paredes que respiram! Arfam? Olhem onde não me posso esconder, no laborioso percurso das tardes jogando-me, brincando, obsessivo gerúndio doutra estória às avessas da história, onde não me vissem mais, quando me distraio, viandante de mim nos alvéolos iluminados do tempo.


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domingo, fevereiro 13, 2005

Rui Knopfli

S. PAULO

Povoado de sombras e fantasmas,
é ranger de passos o que escutamos,
ou apenas o estalido que o tempo
arde na madeira ressequida dos sobrados?

Pilhado, sangrado, espoliado
pela voraz cobiça
de sátrapas, clérigos e soldados,
apenas te legaram
a pesada alvenaria rectangular,
treze órbitas vazias com que fitas
a praça, e o mar em frente,
o silêncio húmido que te desce
das soturnas arcadas
e o lenho sepulcral das portas semicerradas
em que escasseiam batentes e puxadores
ou mesmo o metal pobre
de algum mais caprichoso arabesco.

Não só as portas e os muros.
Também as sombras. E os fantasmas.


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sexta-feira, fevereiro 11, 2005

Frei Bartolomeu dos Mártires

UM CAMINHAR NA CIDADE DE PEDRA E CAL

Na ponta N.E. da ilha está situada a bela e linda cidade de Moçambique servindo-lhe como de coroa a grande e magnífica fortaleza de S. Sebastião, que pela sua celebridade nos merece uma descrição particular (...)
Saindo da dita fortaleza, e passando um pequeno, mas vistoso campo todo limpo plano, e com vistas ao mar pelo sul, e pelo norte aonde a tropa faz as suas evoluções, e exercícios militares; que serve como de passeio público à cidade, e aos mouros de lugar destinado para fazerem amarras, viradores, e cordas de cairo, entra-se na mesma cidade por duas ruas, além de outra que corre junto da praia pela parte do sul. Estende-se a povoação por todo o comprimento da ilha até mais de dois terços da sua extensão, ocupando de mar a mar todo o terreno intermédio. As ditas ruas e outras e outras mais que tem a cidade bem podiam ser tiradas todas em linhas rectas, paralelas, e cortadas igualmente em ângulos rectos, segundo inculca a natureza do terreno; mas infelizmente quase todas são irregulares, tortas sem nenhuma uniformidade. São contudo limpas, e asseadas, planas e algumas das principais argamassadas de tal forma, que causa gosto andar por elas. Há em todas casas nobres e são algumas tão vastas e bem construídas, que podem entrar em competência com os bons palácios das grandes cidades. São as casas e igrejas todas cobertas de terraços, talvez mais pesados e mais fortes que as abóbadas de tijolo: servem-se deles os moradores, não só para os seus divertimentos, e passeios da tarde, mas principalmente para aproveitarem as águas da chuva (únicas que se bebem em toda a cidade) em grandes cisternas, que junto das mesmas casas têm sido construídas.


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segunda-feira, fevereiro 07, 2005

Jall Sinth Hussein

ILHA DE MOÇAMBIQUE 1972

As ruas desertas cheias de vento
como um deus as paredes enormes do forte assistindo a tudo
a areia longa e lisa e a timidez do mar
a língua perdida como ruínas
na mão o cavalo-marinho e os sonhos
o tempo sem chegada e sem partida

assim haveria de ser mais tarde a minha vida


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sábado, fevereiro 05, 2005

Luís de Camões

OS LUSÍADAS (I, 54)

Esta ilha pequena, que habitamos
É em toda esta terra certa escala
De todos os que as ondas navegamos
De Quíloa, de Mombaça e de Sofala,
E, por ser necessária, procuramos,
Como próprios da terra, de habitá-la;
E, por que tudo enfim vos notifique,
Chama-se a pequena ilha – Moçambique.


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terça-feira, fevereiro 01, 2005

(Canção Popular)

EIS O QUE É BELO NESTE MUNDO

Eis o que é belo neste mundo
Eis o que o homem roga acontecer dia após dia
Nós de Beira-Mar gostamos imenso
A nossa alegria de hoje é incomparável, pela vinda destes
amigos de outros Países
Toda a Ilha hoje está abalar.

Naqueles tempos, tempos que já lá vão,
quando vínhamos do continente
Lumbo, o nosso transporte principal era o paporo.
Ao pisarmos a Ilha, avistávamos primeiramente as estatuetas
das muralhas florindo um brilhante candeeiro
Da Ilha para os vários locais viajávamos de riquixós
Quando o paquete adragava era guiado por um piloto, um
farol que piscava da ponta do Mercado Sancul.


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