quinta-feira, julho 09, 2009

Luís Carlos Patraquim

JOSÉ CRAVEIRINHA

Do meu amigo chegarão as flores
e os vaticínios

a dog starv’d at his master’s gate
predicts the ruin of the State


Tanjarinas!

E de mulheres mil
Um Nome,

Ou a pátria,
Rendilhada cortina
Que a usura pui,
E o cós da angústia
No blazer que a Noite em verbo nua
anverso da máscara
Convocando Xipokwés e géiseres e
as aprazíveis praias onde Ulisses
Aportou,

Do meu amigo chegarão as flores
Ai, deus, e u é?


[321]

domingo, junho 14, 2009

Paulina Chiziane

O ALEGRE CANTO DA PERDIZ (excerto)

Para suavizar a verdade e penetrar a profundidade, José dos Montes conta histórias antigas. As melhores histórias começam todas da mesma maneira. Era uma vez....
- A voz do sangue convocou este magno encontro – explica José dos Montes -, sob nossas veias corre o sangue sagrado das pedras. O céu azul foi chocado nos Montes Namuli, num ovo de perdiz. Nasceu com asas de pássaro, voou e colonizou a terra inteira. Aqui nasceu a primeira estrela, do ovo da mesma perdiz, estalou até ao céu, explodiu e espalhou-se como fogo-de-artifício formando a Via Láctea. É aqui o princípio do mundo. O fim do mundo. Todas as raças nasceram aqui. Dão a volta ao mundo e regressam, porque os Namuli unem todos os que querem bem para que comam numa só concha e bebam a água da mesma nascente.
Os braços do canavial ondeiam ao vento, soltando uma fanfarra imensa. Trazendo memórias de todas as origens e a razão da escravidão humana à volta dos cocos, do chá e do sisal.
O rio Zambeze, o mar, o palmar e os Montes Namuli unem-se num polígono de diamante. Deus criou esta terra num momento de felicidade e a prendou de beleza extrema, causando paixão exacerbada em qualquer viandante e, por isso, era uma vez....
Histórias de navegadores que se fizeram ao mar em busca de pipipiri numa terra distante. Histórias das onze sereias, todas irmãs, sendo a Zambézia a mais bela. Memórias dos marinheiros e do chicote dos prazeiros. Histórias das donas e sinhás. Da Companhia da Zambézia, do Boror e do palmar. Histórias das mulheres guerreiras que penetram na fortaleza do invasor, roubaram as sementes os homens e construíram a barreira da vida, mostrando ao mundo quem, perante a mulher zambeziana, o invasor não tem omnipotência. Provando que superioridade das raças era simples treta. Histórias dos deusues dos montes que abençoaram a Zambézia com o sangue divino de pretos, brancos, amarelos, numa sopa de raças mais recheada que sopa de pedra.
- Somos fazedores de chuva e guardiães da água – explica José dos Montes. – Comandantes da trovoada. Nascemos ao canto das perdizes, gurué, gurué! Construímos nas cavernas. Agricultávamos os cereais cm cornos de antílope. Dos ossos longos das gazelas fazíamos os cachimbos para tabaco dos nossos guerreiros. Vieram os brancos e fomos apanhados como ratos. Escravizaram-nos.
Todos erguem os olhos para contemplar mais uma vez a imagem da terra mãe na gestação do mundo. Deixando aflorar a emoção no coração do Éden. Contemplando os montes à distância, confirmando tudo o que já sabiam. És filho apenas do ventre da tua mãe. Desde o nascimento estás só e viverás só. És mãe apenas quando o filho te habita o ventre. Depois do parto, cada um ganha identidade própria e segue o seu próprio destino.
- Somos de passos silenciosos, que pisam o chão em segredo. Que não aceitam a prisão de uma casa. Passos de aventuras na descoberta do novo mundo. Construímos o lar nas encostas dos montes e fomos arrastados pelas enxurradas, éramos filhos das aboboreiras semeadas nas bermas das estradas, colhidos por qualquer viandante. Palmilhávamos o solo até aos confins da terra. Damos a volta silenciosamente e estamos aqui, no ponto de partida. Aqui tudo começa e tudo termina. O mundo é redondo.
A voz inquisitiva dos filhos se ouve. Se os antepassados foram ontem heróis, não se entende que os descendentes saboreiem a parte mais amarga do percurso.


[320]

Colaboração enviada pela Vera Lúcia

domingo, junho 07, 2009

Luís Carlos Patraquim

RUI NORONHA

Porque te esquecerão
E mesmo a língua
Os outros
Os que julgam ser e os poetas
larvas lavras seculares

Eu te redimo
Imperial e livre
- quenguêlêquêzê! -
pai criança das origens
infinito
sob a lua prismática
do Índico


[319]

quarta-feira, junho 03, 2009

Glória de Santana

EPITÁFIO

Eu um dia serei uma poalha de vento
pousando inadvertidamente em tua face

e me sacudirás

Eu um dia serei uma réstea de chuva
caída por acaso em tua fronte

e me sacudirás

E eu um dia serei a última lembrança
imponderável já na tua mente

e então me esquecerás


[318]
Há um lugar reservado à sombra dos palmares para alguém que queira colaborar neste blog. Contacto: liesandjest@gmail.com