Luís Carlos Patraquim
ELEGIA DO NILO
à Odete e ao Amioto
Azul e branco e o deus crocodilo na margem
Diante das ruínas de Karnak,
como sobes, visto daqui, das águas obscuras
Onde Ogum verteu suas lágrimas e cantou
O sulco vindouro, persistente e duro caminhante
De sul para norte sobre as areias, rasgando a volúvel pele
Dos deuses.
Reis e templos, em tuas margens ordenaram o mundo
Entre cada ciclo solar, suspensos do fim;
E louvo a cidade dos que partiram, o fluxo da pedra
que ainda sustém a geometria do eterno
emergindo da tua indiferença; Tu, que escondes os gatos
imóveis e os sabes para sempre espíritos soltos, eriçados; e te deleitas,
vendo-os na ronda dos desenhos enigmáticos, anichando-os junto aos
Sarcófagos que extrapolam de Ti, como se o teu leito derramado
Tivesse soerguido, da solidão granular, o perfil oblongo
Da cabeça de Nefertiti e Te espojasses na beleza efémera
Dos esponsais da Carne;
Ó matéria perecível que as ânforas guardam, aguardam,
Nós que perdemos o divino selo das libações inaugurais e salmodiamos,
No medo litúrgico da palavra esquecida, o simulacro do Livro
E a salvação dos mortos;
O que sabia deles, extirpadas as vísceras, iluminados pelo ouro e a água
De que eras a substância!
Desceram as noites e o desmundo bebeu nas tuas margens
Enquanto Tu cantavas e era de ti o canto
Moldando a forma, lacerando as cidades e erguendo-as,
Com nossos pés descalços sobre a erva, acocorados
E breves, uma inscrição de sangue diluindo-se
Até ao mar.
[142]
quinta-feira, março 24, 2005
domingo, março 20, 2005
quinta-feira, março 17, 2005
Jall Sinth Hussein
TANGERINAS EM REDOR DE MINHA VIDA
Tangerinas em redor de minha vida:
geografia antiga
os hábitos frescos a infância como um rio
a mão poisada sobre muros sem tocar
breves as horas
e a leveza de cada tarde
nenhuma cicatriz no corpo
nenhuma solenidade.
Tangerinas como uma lenda até ao dia de hoje
- distância que às vezes ignoro.
Liberdade tão sagrada e tão nobre
como um gesto mudo e pobre.
Moçambique e meu bairro pequeno
aquelas coisas que voltam toda a vida
entre anos e deveres.
Tangerinas em redor dos meus lugares.
[140]
TANGERINAS EM REDOR DE MINHA VIDA
Tangerinas em redor de minha vida:
geografia antiga
os hábitos frescos a infância como um rio
a mão poisada sobre muros sem tocar
breves as horas
e a leveza de cada tarde
nenhuma cicatriz no corpo
nenhuma solenidade.
Tangerinas como uma lenda até ao dia de hoje
- distância que às vezes ignoro.
Liberdade tão sagrada e tão nobre
como um gesto mudo e pobre.
Moçambique e meu bairro pequeno
aquelas coisas que voltam toda a vida
entre anos e deveres.
Tangerinas em redor dos meus lugares.
[140]
domingo, março 13, 2005
Luís Carlos Patraquim
LIDEMBURGO BLUES (5)
Et pur, magno pórtico onde
neither division nor unity
Matters! Tu, mufana que te atreves,
atira a pedra, rasga
a textura opaca de tanto sangue!
Fere a cicatriz e a dobre, tu
que desceste ao vale dos mortos e sugaste
o osso e encontraste o vazio, batendo-o
na viseira de deus, veste a pele
e não cegues o olho do Leopardo.
Ele espreita os séculos, é quem
vagueia pelos dias e não dorme desde o crepúsculo,
o último que há-de vir
e por onde salta, alma voraz
intumescendo a árvore.
[139]
LIDEMBURGO BLUES (5)
Et pur, magno pórtico onde
neither division nor unity
Matters! Tu, mufana que te atreves,
atira a pedra, rasga
a textura opaca de tanto sangue!
Fere a cicatriz e a dobre, tu
que desceste ao vale dos mortos e sugaste
o osso e encontraste o vazio, batendo-o
na viseira de deus, veste a pele
e não cegues o olho do Leopardo.
Ele espreita os séculos, é quem
vagueia pelos dias e não dorme desde o crepúsculo,
o último que há-de vir
e por onde salta, alma voraz
intumescendo a árvore.
[139]
terça-feira, março 08, 2005
Carlos Gil
UM BAIRRO
Mafalala, oh Mafalala
bairro rico ao metro quadrado,
o maior índice da cidade
de carrinhos em arame moldados
Mafalala, oh Mafalala
onde vivi até aos quinze
- bairro que queriam que eu visse,
o calção limpo,
os olhos fechados
Mafalala, oh Mafalala
bairro de putas e operários…
vendedoras de bazar, mainatos,
tantos caminhos cruzados
Mafalala, oh Mafalala
tantos caminhos para milhares.
Teus becos, meu gelo-doce,
lá despedi a virgindade…
Mafalala, oh Mafalala
onde vivi até aos quinze!
eu de olhos fechados,
tu a ensinares-me a olhar
Mafalala, oh minha Mafalala…
[138]
UM BAIRRO
Mafalala, oh Mafalala
bairro rico ao metro quadrado,
o maior índice da cidade
de carrinhos em arame moldados
Mafalala, oh Mafalala
onde vivi até aos quinze
- bairro que queriam que eu visse,
o calção limpo,
os olhos fechados
Mafalala, oh Mafalala
bairro de putas e operários…
vendedoras de bazar, mainatos,
tantos caminhos cruzados
Mafalala, oh Mafalala
tantos caminhos para milhares.
Teus becos, meu gelo-doce,
lá despedi a virgindade…
Mafalala, oh Mafalala
onde vivi até aos quinze!
eu de olhos fechados,
tu a ensinares-me a olhar
Mafalala, oh minha Mafalala…
[138]
Subscrever:
Mensagens (Atom)