quinta-feira, julho 22, 2010

Grabato Dias

AMOR. TE. TI, TIGO, A MORTE. AMO-TE

Amor. Te. Ti, tigo. A morte. Amo-te
sem R, sem risco ao meio da morte.
Quero-te assim, querente, quente e forte
ode que a circunstância obriga a mote.

Quatorze versos no papel e dou-te
exangue e medido ramo. O corte
já deixou de sangrar. Pinhos do norte!
Que ricas tábuas de caixão, pra bote!

No mundo em pedaços repartida
ficou-me a mim e ao luis vaz a vida,
galinha gorda rebolante ao espeto.

Me, mi, Mimi, migo... Ó amiga, as migas
ainda são um bom prato, e até com ligas
de duquesa se faz tanto soneto.


[326]

domingo, julho 18, 2010

Luís Carlos Patraquim

A CANÇÃO DE ZEFANIAS SFORZA (excerto/ 2)

A verdade é que sucediam episódios estranhos na cidade. Fazer machamba na banheira, arrancar o parquet para lenha, confusionar os elevadores até eles ficarem teimosos e pararem, isso até que se explicava com as adaptações à urbe. Mas as cabeças que começavam a aparecer sozinhas ensombravam os sonhos de Zefanias. Já não bastava os ataques dos boers, as lojas do povo só com papel higiénico quando até a comida era uma dificuldade, para esses xipókwés desesconderem-se na sua condição de limbo e apresentarem-se em forma de cabeças. Cabeça é para pensar e estar no corpo, as duas partes não hão-de ficar separadas.


[325]

terça-feira, julho 13, 2010

Luís Carlos Patraquim

A CANÇÃO DE ZEFANIAS SFORZA (excerto/ 1)

Morava no que fora um chalet, na Avenida 24 de Julho, quando os tramways subiam a D. Carlos, depois Manuel de Arriaga, agora Karl Marx, dobrando a Central Eléctrica e subindo, chiando, extenuando-se.

"A 24 de Julho é uma avenida coerente".

Verdade que a frondosa via, que atravessa a cidade a meio, na sua parte alta, desenrolando-se desde o bairro da Polana até ao Alto Mahé, mantivera a mesma designação. Nome desde o antigamente por causa da sentença do Marechal Mac-Mahon sobre os territórios da Catembe, defronte da baía, que Sua Majestade britânica reivindicava à dita soberania portuguesa e que assim se manteve por ter sido essa a data das famosas nacionalizações, loguinho mesmo a seguir à independência. Zefanias, que não era dado a sinuosidades semânticas, classificava como mesmura essa teimosia toponímica, alheio a manifestas incoincidências políticas. Nunca lhe consegui uma explicação para o termo.

O dito chalet, verdade seja, tinha mais de evocação do que de estatuto, relíquia de uma certa belle époque cujos perfumes cruzaram os oceanos, dobraram o cabo e aportaram na cidade. Aqui uma frontaria em arcos, lavrada, uns muros à inglesa, colunatas modestas, um e outro hotel junto ao porto, o can-can de algumas vaporosas francesas. Mas a cidade era na baixa. No altos, que Mouzinho de Albuquerque ainda subira a cavalo poucos anos antes com medo das emboscadas, a zona fresca propiciava as casas avarandadas onde uma burguesia sempre apavorada com a biliosa mas a prosperar podia dizer que pegava na lancheira e ia para o campo. Poucos sobravam, quase nenhuns, diga-se a verdade, ora substituídos ou acrescentados, ora vergastados pelo tempo.


[324]

domingo, julho 04, 2010

Luís Carlos Patraquim

REINALDO FERREIRA

Cores do poema
alado
Garupa azul
Quando cais
Gorjão

[323]