sábado, agosto 28, 2004

Júlio Carrilho

PORTA DE ÁGUA

Quarenta e tal quilómetros quadrados
de modorras viradas para a praia
escoam dos solares escancarados
a deixar os mortos a olhar
luzentes cristais de água de cambraia

Não sei ainda se isto é alegria
deixada até ao estoiro da miséria
mas a calma tecida dia-a-dia
tem o vagar da pressa que se quer
no endógeno assumir-se de matéria

Ah porta minha que deste as águas
para buscar as faces da verdade
hoje descontraída em tuas mágoas:
não tens a quem explicar o teu saber
que a nudez distorce sem maldade

Teremos que esperar que se decante
no teu líquido palco o som dos remos
se afinem silhuetas de ar cortante
para depois por ruas sem licença
abrirmos planos que só nós podemos


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